Oi!
O ano é 1991 eu estava em casa à noite em Aparecida de Goiânia cidade que faz parte da região metropolitana de Goiânia. Por volta das 19 horas escutei crianças chamando à porta, minha mãe foi atender e eu permaneci no meu quarto, ela os cumprimentou e daí a pouco começou a mexer nas latas de mantimentos na cozinha, fui ver o que estava acontecendo e ela estava tirando um pouco de arroz, feijão, açúcar e parte de outros mantimentos, colocando-os em sacolas de plástico, levou e entregou às crianças.
Fui ver quem era e percebi que eram umas cinco mais ou menos, o mais velho deveria ter uns 12 anos e o mais novo uns 6 anos. As crianças agradeceram com o tradicional "Obrigado Tia Dulce" e foram felizes pra suas casas, minha mãe fechou a porta e eu a perguntei o que estava acontecendo. Achei realmente estranha a atitude dela pois a poucas horas estávamos nós sem um grão de arroz em casa, pois eu e meus irmãos estávamos desempregados e o pagamento dela estava com atraso de cinco meses, e os mantimentos que naquela hora tínhamos era uma doação do grupo de jovens da igreja que somos membros (em outro momento contarei essa história).
Minha mãe se sentou na sala e me disse:
- Você viu como ficamos preocupados por não ter o que comer não é mesmo? E olha que foi só hoje, graças a Deus e nossos amigos não chegamos realmente a passar fome, mas aquelas crianças vivenciam isso todos os dias.
- Elas residem com sua avó, são no total nove crianças de várias filhas e filhos dessa senhora, eles tem filhos e acabam trazendo pra ela criar, e também não ajudam financeiramente. Essa senhora é aposentada mas o dinheiro dela só dá pra pagar as contas e comprar seus remédios, e o pouco que sobra consegue fazer uma compra que dura no máximo 10 dias.
- Eu sei disso porque os quatro mais velhos são do projeto que eu sou monitora na Assistência Social, e enquanto eles tem o que comer eles participam, quando eles somem eu já sei que está faltando comida.
- Você viu que eles estavam com outras sacolas?
- Sim!, respondi.
- Então, aquelas crianças levantam de madrugada pra pegar o primeiro ônibus pra irem no CEASA, elas chegam lá já no final das vendas e elas ficam pegando no chão ou no lixo as verduras que não foram vendidas, é tão longe que elas só conseguem chegar nesse horário.
- Quando chegam em casa, sua avó tira as partes inservíveis das verduras e coloca numa lata com água fervendo, pra cozinhar as verduras, e depois de temperada com sal ela coloca papelão picado pra engrossar o caldo e dar sustento na alimentação, assim todos dormem com o estômago cheio.
Quando minha mãe acabou de me contar, eu estava chorando. Na verdade enquanto escrevo meus olhos se enchem de lágrimas, essa história me impactou muito, marcou minha alma pra sempre. Realmente eu não sei o destino dessas crianças, fui trabalhar em outros estados, em outros município, escrever minha própria história, mas aquela noite, foi um divisor de águas para mim.
Prometi a mim mesmo, fazer o possível e o impossível para ajudar as pessoas, aquilo que não consigo fazer envio às mãos de Deus enquanto faço minha parte. Quando vejo pessoas maltratando outras pessoas, julgando-as por se acharem melhores, por uma questão de instrução, posição social, financeira ou status, meu coração dói, como uma adaga cravada fundo em meu peito.
Sempre me lembro dessa história, toda vez que vejo alguém sofrendo, por qualquer motivo, eu me coloco à disposição pra ajudar, e mesmo quando a pessoa não me agradece, mesmo quando essa mesma pessoa me machuca, com atos ou palavras, eu me lembro da lata com água fervendo em cima de uma trempe improvisada de fogão à lenha, com verduras semi estragadas e papelão pra engrossar o caldo, e assim me ergo e continuo a minha jornada.
Creio que a vida é assim, a maioria das pessoas gastam seu tempo em discussões superficiais, muitas vezes se digladiando pelo bem próprio, pelo próprio bolso, pelo próprio "status quo". Existem pessoas reais, passando por necessidades reais, desejando nossa ajuda real.
Às vezes precisamos sair de nossa caixa, para ajudar a quem de nós exige atenção.
Obrigado por ler até aqui, um grande abraço.
Titus●•ツ
"O Som do Coração" (๏̯͡๏)
"O Som do Coração" (๏̯͡๏)
"O ser humano possui a vontade imprescindível de se guiar pelas aparências. Consequentemente, as pessoas criam impressões erradas sobre o próximo: acham que conhece mas na verdade não conhecem. E é por tentativa e erro que superamos essa nossa natureza."