A Ponte dos Dois Ventos
(Titus, o som do coração)
Muito antes do tempo ser contado em calendários, existia um caminho oculto entre dois vales: um fértil e conhecido, o outro misterioso e cheio de luzes que mudavam de cor conforme o sentimento de quem olhava.
Entre esses vales, erguia-se a Ponte dos Dois Ventos — uma passagem feita não de pedra ou madeira, mas de brisa e sussurros. Atravessá-la era possível apenas uma vez. E quem o fizesse teria de deixar para trás algo que não se podia carregar nos braços: um afeto, uma certeza, uma parte de si.
A ponte era vigiada por dois ventos antigos e sábios:
O Vento do Norte, que soprava promessas — falava dos sonhos, dos caminhos ainda não trilhados, da liberdade que assovia nas montanhas.
E o Vento do Sul, que carregava memórias — cheiros da infância, risos antigos, o toque de mãos que já não estão.
Certo dia, um homem chamado Taren, de alma inquieta e olhos cansados, chegou à beira da ponte. Trazia no bolso um punhado de terra da sua aldeia, e no peito um nó que não sabia desfazer.
Ali, diante da ponte, o mundo silenciou.
— “O que você busca?” — soprou o Vento do Norte.
— “O que você teme perder?” — sussurrou o Vento do Sul.
Taren não respondeu. Apenas fechou os olhos e sentiu o peso da decisão. À sua frente, o desconhecido. Atrás de si, tudo o que era familiar. Entendeu então que escolher era também morrer um pouco. Mas viver sem escolher… era morrer por inteiro.
Deu o primeiro passo. E a ponte o recebeu.
Ao atravessar, sentiu-se mais leve. Mas não porque estava livre. Era porque algo havia ficado para trás: um amor antigo, uma segurança cômoda, uma identidade que já não lhe cabia.
Nunca mais voltou.
E dizem os mais sensíveis que, nas noites em que os ventos dançam sobre as colinas, pode-se ouvir o som de Taren conversando com os dois ventos — grato, embora marcado.
Porque o preço da escolha verdadeira não é o que se perde. É o que se ganha… de si mesmo
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